Ausência (doída) neste 8 de setembro!
Ausência
Qué triste se ha vuelto el mundo!
R. de Castro
PAI
que será de mim neste mundo
sem o doce peso dessa mão suada
sulcada de rugas e veredas
em que tudo se perdeu
ou por fim se há de perder…
PAI
onde estás que não te vejo,
olhar assim da janela fere de morte
a frágil pupila de qualquer criança…
sei que é de manhã, aí está o sol
o céu esse falso clarão e sei
que assim é mas o que vejo
em sonhos é sombra e cerração…
PAI
diz que é mentira ilusão
de óptica miragem viagem de volta
ao encontro de duas vidas desencontradas
diz que não, diz que sim, vem pai, quero
tua mão antiga firme sobre mim — e não
essa ausência sempre…
Eternidade… ausente presença
do que foi e sempre será: princípio
luz e força suor e sangue risos
e lágrimas, amor e obras, coração
na mão feito presença mesmo quando
ausente no tempo e em tantos lugares
da vida… e muitas vezes, muitas, dias,
meses, anos, tantos, nas aleatórias
circunstâncias nas peculiares circunstâncias
de nossas vidas no breve espaço
em que nos foi dado viver.
Já sei que de nada vale tanto verbo,
perdido perdido está e perdidos
estamos no mundo, neste e em qualquer
outro, existente ou não…
PAI
perdi a fé e a esperança,
só me resta a palavra
e a palavra é a lâmina a escopeta a mina
e cada verso um gesto de autodefesa
frente aos golpes baixos da vida
© do livro “entre folha e andorinha“, publicado a 17.12.2020 como eBook (https://www.amazon.com/dp/B08QZVQGKF) e Paperback (https://www.amazon.com/dp/B08QWBBCB4)